O sofrimento da ansiedade por separação
Quando ficar sozinho torna-se um suplício para o cão.
Olá, amantes dos bichos, tudo certo?
Hoje eu vou contar uma história que mexeu comigo tanto pelo ocorrido quanto porque, mais uma vez, constatei que a companhia de um animal de estimação pode mudar tudo, tudo mesmo.
****
A Covid levou seu companheiro da vida toda. E com ele, a graça dos dias de convivência e o aconchego do carinho ao longo dos anos em que estiveram casados. O filho, também abalado com a perda, ficou com ela por um tempo que se acabou quando foi chamado de volta para a realidade que construíra em outro país. E assim, após um período inicial de luto dolorido, ela se viu só… só com Nino, o pretinho que haviam resgatado dez anos antes.
O pequeno era o grude do marido, que já estava aposentado quando o adotaram. Ela, ainda imersa no trabalho como secretária, precisou esperar mais dois anos até sua própria aposentadoria. Apesar de sentir um discreto ciúme da relação tão próxima do companheiro com o Nino, gostava de ver os dois inseridos num dia a dia gostoso que incluía pelo menos dois passeios diários, tardes preguiçosas no sofá, a rotina da alimentação e da comunicação entre eles. Coisas simples, mas que faziam um bem danado a ambos.
E quando se viu tentando iniciar uma nova rotina com Nino agora que o humano de referência dele tinha partido, ela percebeu que ele estava tão perdido quanto ela. Tudo se mostrava fora de contexto. A sensação de um vazio estranho parecia também permear o íntimo de Nino, já que ele dava sinais de que algo não ia bem: toda a vivacidade parecia ter se apagado, o apetite já não era mais o mesmo, dormia muito.
Com o tempo, a relação entre os dois foi se estreitando; se agarraram um ao outro e, sem perceber, se tornaram o remédio que ambos precisavam para aliviar a dor.
Mas mal sabia ela que o conforto emocional de ter Nino sempre ao seu lado, como uma sombra, estava se transformando em um problema… um problema que comprometeria o bem-estar do peludo.
“Não vá embora!”
Quando os efeitos da pandemia começaram a aplacar e ela pode voltar a ter a vida social de que tanto gostava, foi informada pela vizinha de que Nino havia passado uma tarde inteira chorando e uivando à porta. Isso a assustou, pois ele jamais tivera este tipo de comportamento, mesmo quando ela saía para compromissos junto com o marido.
A culpa surgiu, acusadora. Como não percebeu que seu cão estava sofrendo? Como não entendeu que ele não sabia lidar com a solidão? A dor dele a atingiu como uma segunda perda - uma saudade nova do marido, um peso por não ter notado antes o sofrimento silencioso de Nino.
Estava, já naquele momento, tão apegada ao cão que não poderia conceber que ele vivesse em sofrimento, mesmo que fosse necessário sacrificar seus chás da tarde com as amigas. E foi aí que uma conhecida me indicou.
Só tinham um ao outro
Todos os treinos e providências que indiquei a ela foram seguidos com uma dedicação que chegou a me comover. Para ela, devolver ao Nino a qualidade de vida que ele tinha antes da despedida do marido era mais do que uma missão… era uma forma de homenagear a memória dele. Era também um jeito de agradecer ao pequeno pelo apoio que recebeu quando a dor parecia insuportável.
O fato dela ter tanta consistência nos treinos e entender que precisava estimular o Nino a ser feliz novamente, independente da presença dela, fizeram os resultados surgirem logo.
Mas o que mais me impactou durante o período em que estive com eles foi perceber que esse vínculo entre os dois, solidificado em meio ao sofrimento, ao mesmo tempo em que gerou um problema comportamental, também trouxe a solução.
Ansiedade por separação
Desde o primeiro contato com os dois foi possível notar que o Nino tinha problemas relacionados à separação e o gatilho para que os sintomas surgissem foi a separação abrupta de seu humano de referência com o posterior deslocamento do vínculo para a tutora.
Infelizmente, situações de grande impacto emocional, como o falecimento de um tutor ou outro animal, o retorno ao trabalho após um longo período em casa, ou mudanças e residência sem adaptação adequada, podem desencadear esse distúrbio.
Eu acredito que seja um dos transtornos que mais fazem os cães sofrerem e interferem diretamente na rotina dos tutores, que precisam reorganizar suas vidas para garantir o bem-estar do animal.
Prevenção
Qualquer que seja a realidade de sua família, não deixe de sempre pensar em prevenir a ocorrência da ansiedade por separação. E como fazer isso? Alguns pontos são essenciais:
· Manter uma rotina previsível para o cão, trazendo segurança e estabilidade.
· Oferecer atividades para ele se entreter sozinho, como brinquedos interativos e ossos naturais.
· Estabelecer passeios diários—não apenas alguns dias na semana, mas todos os dias.
· Ensinar o cão a ficar tranquilo sem sua presença, permitindo momentos em que ele esteja em outro cômodo sem problemas.
A gente nunca sabe o que pode acontecer lá na frente. E nem o quanto algum evento poderá impactar na vida de nosso melhor amigo de patas. Então, cultivar uma relação bonita de amizade com ele é muito importante, mas sempre pensando em garantir que ele mantenha sua independência para poder ser feliz.
Um abraço e até a próxima,
Cassia
Adorei ler seu relato, como sempre. No meu caso, eu pessoalmente tenho dificuldade de deixar o Domingo sozinho, nao consigo ficar tranquila 100%, e percebo que a ansiedade é minha, pois ele normalmente vai dormir, e sabe que voltaremos logo.